Toda a documentação estava organizada por ordem alfabética
em ficheiros. Eram gavetas metálicas enormes, com cavaleiros a indicar a
respectiva letra. Se procurasse, por exemplo, inocência, ia à letra i
onde, depois de incêndio e antes de inocuidade, encontrava incentivo
para tudo registar numa tábua rasa que guardava num canto da sala de
trabalho.
À medida que os assuntos invadiam aquele espaço de cem
metros quadrados, eu tinha de arranjar lugar para as palavras que se
acumulavam, dispersas pelos mais variados lugares. Esta catalogação era uma
tarefa minuciosa, mas simpática, que me trazia realização pessoal, pois
convivia directamente com definições e conceitos úteis para a minha vida.
Algumas entradas tinham apenas a palavra em causa, mas
depois havia um vazio. Era o caso de uma das primeiras, com a palavra absurdo,
e uma das últimas, com a palavra universo. Todavia era um trabalho
interessante, como dizia, também porque algumas pessoas vinham à sala para duas
de conversa e davam-me coragem para arranjar soluções na arrumação dos
ficheiros metálicos, às vezes com fatias de piza, barrinhas de chocolate e
latas de coca-cola pousadas em cima. Esquecia-me de comer, por vezes, com o
entusiasmo.
Até que um dia recebi ordens para abandonar o local de
trabalho, ou seja, dispensaram-me para reestruturação do serviço. Sofri
bastante com esta mudança (mudança era uma das entradas que apenas tinha
nome, mas faltavam ainda explicações e elementos de registo mais detalhados).
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